sábado, 13 de agosto de 2016

As Funções da Consciência



Sensação - Intuição - Sentimento - Pensamento


No que se refere aos tipos psicológicos, nós podemos dividir a psique humana de duas formas: um modo duplo, o qual define o modo como reagimos às circunstâncias externas, e um modo quádruplo, o qual define a forma como a nossa consciência percebe e assimila as experiências e eventos. A primeira divisão é representada pelos conceitos de introversão e extroversão, que já foram abordados em um texto anterior aqui no blog intitulado “Qual é o seu tipo?”. A segunda é representada pelas assim chamadas “funções da consciência”: pensamento, sentimento, percepção e intuição.

Nesse sentido, nós podemos perceber uma experiência, uma situação ou um objeto como algo que existe (sensação), como isto e distinto daquilo (pensamento), como agradável ou desagradável (sentimento) ou de onde veio e para onde ele vai (intuição). Nascemos com todas essas funções em potencial dentro de nós, mas vamos desenvolver apenas uma delas, mais do que todas as outras, conforme nossa disposição intrínseca. A função que a gente desenvolve melhor se tornará a nossa função principal. Essa função vai influenciar a forma como vemos, apreendemos, avaliamos e interpretamos a vida.




As pessoas que tem a função pensamento como principal são normalmente desprendidas, comunicativas, interessadas no mundo das idéias e privilegiam a racionalidade. Sentem a necessidade de relacionar as experiências da vida com um parâmetro de idéias pré concebido, que podem vir do exterior, extraído de livros, ensinamentos e conversas, ou podem vir de dentro, através do trabalho mental do próprio indivíduo. Fundamentalmente, o tipo pensativo estabelece a diferença, através da lógica, entre “isto” e “aquilo”, coleta e classifica a informação, pesando uma coisa contra a outra, e compondo um parâmetro filosófico a partir dos pedaços e fragmentos. Possuem a mente altamente desenvolvida, o senso de justiça e a capacidade de avaliação impessoal das situações, o amor pela cultura, a valorização da estrutura e do sistema, a corajosa adesão a princípios e o refinamento. Por outro lado, o mundo das trocas emocionais pessoais é o maior problema para este tipo. Muitas vezes eles são considerados frios, distantes, insensíveis e demonstram uma certa aversão a demonstrações emocionais. Em outras palavras, esse tipo tem um problema com o sentimento, porque ao contrário de tudo o mais que cai sob seu olhar, este não pode ser classificado, estruturado, analisado ou encaixado em parâmetros.

Por outro lado, para os que têm a função sentimento como principal nada é tão importante no mundo como os relacionamentos pessoais e os valores humanos. Sem eles o mundo é estéril, despido de esperança e alegria. Sacrificam qualquer coisa para preservar os seus relacionamentos. No sentimento, “isto” não é diferente “daquilo”, tudo é um e todas as diferenças se fundem. A única diferenciação que esse tipo faz é se um sentimento lhe parece apropriado ou não. São compassivos e empáticos, possuem uma grande capacidade de sentir o que o outro sente. Possuem sensibilidade ao ambiente, sutileza, encanto e compreensão, um forte senso de valores nos relacionamentos e a capacidade de juntar indivíduos e instintivamente entender as suas necessidades. No entanto, o tipo sentimento é um pouco infantil em relação ao mundo das idéias, da razão. Embora sejam sempre susceptíveis a dor dos outros, muitas vezes são incapazes de entender objetivamente que as pessoas pensam de forma diferente e tem deferentes necessidades e valores. Tentam colocar o seu manto de solicitude sobre tudo que perturbe o seu senso de harmonia e podem acabar não percebendo que algumas pessoas consideram isso sufocante. Por isso, o tipo sentimento muitas vezes se sente ferido e emocionalmente rejeitado nos seus relacionamentos. E, portanto, precisariam desenvolver mais o pensamento, a clareza e a objetividade.

O tipo sensação, por sua vez, prioriza os sentidos como forma de se orientar e foca sempre o aspecto concreto daquilo que é percebido. São práticos, eficientes, cheios de senso comum, realistas, organizados e amantes do dinheiro, da segurança e do status. Estão à vontade com o seu corpo, identificam-se com ele e, em geral, são saudáveis porque conseguem expressar seus desejos físicos. Lidam muito bem com as coisas ao seu redor, com o dinheiro e com as responsabilidades e possuem o dom de concretizar seus desejos. No entanto, quem tem a função sensação como principal tende a valorizar somente aquilo que pode perceber e, conseqüentemente, acaba perdendo muita coisa. Por valorizar excessivamente o lado prático da vida, deixam de perceber o significado maior e mais abrangente da existência, e se perdem em meio a uma rotina de trabalho e acumulação de objetos. Por serem um pouco escravos da realidade, não conseguem aproveitar o presente de forma criativa, solta e lúdica. O tipo sensação tem um problema com o lado mais sutil e intuitivo da vida. Por isso, a busca por alguma espécie de realidade espiritual é absolutamente necessária para este tipo, para suprir o vazio existencial e não danificar ao alicerces concretos sobre os quais construiu a sua vida.

E então chegamos à quarta e última função da consciência: a intuição. A intuição se refere a um tipo de percepção inconsciente sobre a realidade que surge espontaneamente na consciência, como um pressentimento. Ela fornece um conhecimento irracional sobre os fatos e as pessoas e, portanto, é oposta à função sensação, que se relaciona apenas com os dados concretos e imediatos das experiências.  O tipo intuitivo possui uma vitalidade e espontaneidade que muitas vezes é alvo de inveja dos outros tipos.  São sonhadores, brincalhões, artistas, exagerados, dramáticos e com gosto pelo colorido e pelas artes. Estão interessados no futuro e no seu interminável potencial, e seus palpites são tradicionalmente infalíveis. Por outro lado, não suportam ver a vida aprisionada na forma. Os intuitivos têm problemas em lidar com o mundo que está sempre cheio de objetos, pessoas, estruturas, leis, contas para pagar, necessidade de ganhar dinheiro, de se vestir, alimentar, etc. Simplesmente não conseguem ter um bom desempenho com as coisas práticas da vida. Ou seja, o tipo intuitivo tem um problema com o mundo dos sentidos e precisaria aprender simplesmente a se relacionar com o corpo pelo corpo.

Enfim, cada um desses quatro temperamentos vê e valoriza um diferente aspecto da realidade. Entender um pouco dessa tipologia básica, além de ser um meio divertido de rotular as pessoas do nosso convívio, é uma excelente maneira de aprendermos a mais difícil das lições: que nem todas as pessoas são iguais e que nós podemos aprender muito uns com os outros. Essa é a riqueza da vida, e ela só se torna acessível quando existe uma partilha de diferentes realidades e quando admitimos o mérito dos valores dos outros.

Na verdade, qualquer que seja a função da consciência com a qual nos identificamos precisamos aceitar a existência de todas elas dentro de nós, principalmente a existência da função inferior e menos desenvolvida. A vida não é estática, e a nossa psique trabalha sempre no sentido de encontrar o nosso equilíbrio. Nós crescemos em direção ao nosso oposto. Isso constitui, ao mesmo tempo, uma das maiores batalhas, uma das maiores alegrias de um dos aspectos mais significativos da experiência de viver.



Por Melissa Samrsla Brendler
Psicóloga - CRP 07/13831
Atende em Porto Alegre/RS




2 comentários:

  1. Ótimo texto! Poderia indicar referências ou livros sobre? Desde já grato!

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  2. Oi Bruno! Obrigada! A referência principal seria o volume VI das Obras completas do Jung - Tipos Psicológicos, porém ele é bastante denso e seria um estudo para quem já está acostumado a ler suas obras. No entanto, existem vários livros introdutórios do seu pensamento com linguagem mais acessível e de fácil entendimento. Deixo aqui como sugestão A Tipologia de Jung, da Marie Loiuse Von Franz e James Hillman (editora Cultrix). Há também um capítulo específico sobre esse tema no livro "Relacionamentos" da Liz Greene (Cultrix), que é uma psicóloga e astróloga americana. A linguagem dela é ótima e o livro é muito bom também. Foi a base para a formulação deste texto. A propósito, preciso colocar as referências. Abraços

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