sábado, 24 de setembro de 2016

No caminho da Individuação: o confronto com a Persona e a Sombra.






A individuação é o processo de desenvolvimento da nossa totalidade, ou da nossa singularidade mais íntima, única e incomparável, como disse Jung. É um movimento que nos leva em direção a uma maior liberdade de expressão, pois implica na diferenciação da nossa personalidade em relação à psicologia do coletivo. Esse processo implica na integração de várias partes que compõem a nossa psique, para que elas possam se expressar de maneiras mais sutis e complexas.

No texto intitulado Qual o Propósito da sua Vida? falei um pouco sobre o processo educativo e o quanto ele é importante para a convivência em sociedade, e por outro lado, o quanto desse processo implica em sermos colocados dentro de determinados compartimentos, que acabam por nos afastar da nossa verdadeira natureza. Esses compartimentos são fruto de uma adaptação, e representam um compromisso entre o indivíduo e a sociedade acerca daquilo que alguém parece ser. Do ponto de vista do coletivo, tais dados são reais, mas em relação à individualidade essencial da pessoa, representam algo de secundário.

Na psicologia Junguiana, essa forma de adaptação recebe o nome de Persona. A palavra vem do teatro grego, no qual cada ator utilizava uma máscara para representar seu personagem. A palavra personagem surgiu da palavra Persona. A Persona é como se fosse uma máscara ou fachada que exibimos para facilitar nossa comunicação com o mundo externo e assim sermos aceitos por determinados grupos do qual fazemos parte, pela sociedade em que vivemos e também para que possamos cumprir os papéis a nós exigidos. Dependemos dela nos nossos relacionamentos, no trabalho, na roda de amigos e na convivência em geral.

De forma positiva, como falei antes, a Persona auxilia na convivência em sociedade e transmite uma sensação de segurança, já que cada um age dentro daquilo que é esperado. Além do mais, serve também como proteção em relação às nossas características, desejos, pensamentos ou sentimentos internos que não serão bem vistos pelos outros e que, portanto, precisamos esconder.

Porém, por outro lado, acontece freqüentemente de nos identificarmos a tal ponto com as nossas Personas que acabamos nos afastando da nossa verdadeira natureza. Quando somos possuídos, por assim dizer, por nossas personas a ponto de ficarmos totalmente identificados com elas, além de passarmos a viver de forma automática, sem uma reflexão mais profunda sobre nossa existência, também nos tornamos pessoas difíceis de conviver. Ficamos rígidos e passamos a exigir que os outros se comportem assim ou de acordo com aquela nossa persona em ação.

Obviamente não ter persona nenhuma é tão negativo quanto termos em excesso. Afinal, ninguém fala tudo o que sente e pensa, ninguém faz tudo o que der vontade. Há um limite, um respeito com o próximo, uma ética, mas isso não pode nos fazer esquecer de quem somos verdadeiramente. É como expressa uma das cinco sabedorias do Budismo: nós não somos as identidades que criamos todos os dias, mas a liberdade que cria essas identidades.

Por isso, o primeiro passo no caminho da individuação é a tomada de consciência, compreensão, desnudamento e dissolução das nossas personas. Por trás das personas está a nossa sombra, nosso “lado negro”, por assim dizer, que são todos os comportamentos, traços de personalidade e crenças que suprimimos ou reprimimos por terem sido considerados negativos para serem aceitos. Persona e Sombra fazem uma espécie de compensação. Quanto mais a persona é luminosa e “banhada em purpurina”, mais acentuados são os elementos que compõem a nossa sombra.

Como fomos condicionados, e também por ser algo desagradável de admitir, costumamos negar os aspectos que compõem a nossa sombra. A conseqüência natural é passar a enxergar esses conteúdos do lado de fora de nós mesmos, nas outras pessoas: desprezamos e nos irritamos com o outro, pois o outro passa a representar aquilo que não posso, ou não consigo reconhecer em mim. O tão conhecido fenômeno psicológico da projeção, com todas as suas implicações para os relacionamentos.

Por isso, um dos maiores e principais trabalhos que temos no desenvolvimento da nossa personalidade no caminho da individuação é, primeiro, o desnudamento de nossas personas, e depois a conscientização e integração da nossa Sombra, através da retirada das projeções no mundo exterior. Quando aceitamos a realidade das nossas sombras podemos ficar livres da sua influência, além de também podermos tomar consciência de muitas riquezas que estavam escondidas. Os aspectos da nossa personalidade que foram descartados poderão ser trabalhados e se tornarem novamente úteis, uma vez que não serão mais prejudiciais à nossa adaptação e poderão mudar o rumo da nossa história.

Além do mais, se queremos mudar o mundo, precisamos começar por nós mesmos. Olhar com atenção para aquilo que costumamos enxergar nos outros e perceber se isso não é apenas um reflexo daquilo que está escondido dentro de nós. Jung costumava dizer que o melhor trabalho político, social e espiritual que podemos fazer é parar de projetar nossas Sombras nos outros, pois quando formos capazes de enxergar nossas próprias mesquinharias, ciúmes, ódios e rancores, então isso poderá se reverter num bem positivo, porque em tais emoções tão destrutivas está armazenada muita energia vital, e quando se tem tal energia à disposição, ela poderá ser utilizada para o nosso próprio crescimento e integração.



Por Melissa Samrsla Brendler
Psicóloga - CRP 07/13831
Atende em Porto Alegre/RS






domingo, 18 de setembro de 2016

Individuação: tornar-se si mesmo





Todos nós possuímos uma tendência inata, natural e espontânea para encontrar nosso centro, nossa unidade, ou nossa totalidade.  Essa tendência não é um fim, mas um processo, que se desenvolve no tempo, chamado de “individuação”. A individuação consiste em evoluir de um estado infantil de identificação com o inconsciente para um estado de maior diferenciação em relação a ele, resultando na ampliação da consciência. Os elementos inatos da nossa personalidade, seus componentes mais imaturos e as experiências de nossa vida procuram se integrar ao longo do tempo formando uma totalidade em pleno funcionamento.

Da mesma forma que possuímos uma estrutura física comum, todos temos também uma estrutura psíquica comum. Todos nós possuímos um coração e um pulmão, por exemplo. Com a psique acontece algo semelhante, pois ela também possui uma estrutura e um modo de funcionar que são comuns. Os arquétipos são esses elementos comuns da psique humana e, de certa forma, corresponderiam aos elementos comuns do corpo humano.

Os arquétipos são os blocos básicos da construção da personalidade. São padrões de emoção, de imaginação e de significado. A soma de todos eles compõe o inconsciente coletivo e forma o substrato básico da nossa vida emocional. Quando ativados, atingem a consciência e influenciam no desenvolvimento e expressão da nossa personalidade de forma bem definida. Os arquétipos nos impelem a certa atividade física, que será acompanhada por imagens, fantasias e emoções características.

Um bom exemplo é a experiência de apaixonar-se por alguém, uma experiência típica e que apresenta uma base arquetípica. Quando nos apaixonamos, sentimos um desejo sexual e ao mesmo tempo nossa consciência é inundada por fantasias referentes à pessoa amada. Experimentamos o surgir de profundas emoções e verificamos que no centro de tudo há um significado profundo. É um estado de coisas único para nós. No entanto, em todo mundo a linguagem do amor é admiravelmente a mesma. A experiência humana em si é tão antiga como a própria vida humana. Em outras palavras, é uma experiência arquetípica.

É claro que a vida humana é, ao mesmo tempo, única. Apesar dos corpos humanos possuírem todos a mesma estrutura, não são, contudo, exatamente iguais. O mesmo acontece com as personalidades. A personalidade de cada um jamais existiu antes. Há alguma coisa em cada pessoa que faz com que seja ela somente. No entanto, enquanto vivemos inconscientemente, tendemos a ser semelhantes aos demais. Os arquétipos vão nos formando de acordo com os moldes gerais da humanidade, e tornamo-nos o homem coletivo. Mas se adotamos uma outra atitude em relação ao inconsciente, se nos tornamos conscientes do que somos e dos elementos únicos que existem em nós, então começa o desenvolvimento individual. Os mesmos arquétipos que antes nos modelavam pelo tipo de homem comum, agora começam a nos ajudar a nos tornar indivíduos, no momento em que estabelecemos uma relação consciente com eles.

O inconsciente coletivo, ou a soma de todos os arquétipos, portanto, contém não apenas a sabedoria do passado, como também a energia do futuro ou um enorme potencial criativo. A vida está constantemente lutando por fazer surgir formas novas e únicas. No centro do inconsciente há um instinto profundo para tornar-se si mesmo, para expressar a personalidade única que há em nós. Uma personalidade que é integrada ao inconsciente. Naturalmente, ninguém consegue tornar-se um indivíduo completo e total. Sempre ficam muitas possibilidades em nós que poderiam ser desenvolvidas em nossa vida. O importante é o processo de tornar-se uma pessoa mais desenvolvida. É isso que dá significado à vida e interesse pela mesma. O sofrimento e as doenças psíquicas são decorrentes da nossa resistência ao desenrolar natural desse processo.

A individuação é o instinto fundamental da vida. Atua sobre nós e nos impele a procurar e a tomar consciência da nossa totalidade. Não só tomar consciência, como também expressa-la. O objetivo é nos tornarmos a pessoa que realmente somos, e isso não se dá somente através do processo de aceitação de si mesmo. Além de se conhecer, devemos também nos colocar no mundo. Buscar o equilíbrio entre as demandas do mundo externo e interno. Descobrir o nosso papel na sociedade, o lugar em que podemos viver a nossa própria natureza individual para o bem-estar da sociedade. Esse processo não nos leva ao isolamento, mas a um relacionamento mais íntegro com o coletivo. Tornar-se si mesmo não significa tornar-se perfeito, mas pleno e completo. Assumir a própria condição humana tal qual se apresenta, e vive-la com todas as suas implicações e riquezas, com todas as dores e as delícias de ser quem se é.



Por Melissa Samrsla Brendler
Psicóloga - CRP 07/13831
Atende em Porto Alegre/RS










domingo, 11 de setembro de 2016

Qual é o propósito da sua vida?





Neste mundo rápido e acelerado em que vivemos, normalmente não há muito espaço para refletir sobre a própria vida. Vivemos de forma automática, esmagados pelas demandas do cotidiano, submetidos às imposições da sociedade e com uma sensação de escassez de tempo constante. Sentimos como se tivéssemos nos perdido no meio do caminho, e muitos já não enxergam mais um sentido ou propósito para a própria existência. Porém, como disse o psiquiatra chileno Cláudio Naranjo, “é normal não encontrar sentido na vida quando se está muito condicionado pelo mundo”.

Desde que nascemos somos ensinados a nos guiar a partir de um modelo que é oferecido por outras pessoas. O processo educativo é uma parte importante e indispensável na formação e estruturação da personalidade de qualquer pessoa. Receber limites e aprender as normas sociais nos prepara para a futura convivência em sociedade e lança as bases sobre as quais conseguiremos sobreviver no mundo. No entanto, esse processo, na maioria das vezes, implica em sermos colocados dentro de verdadeiros compartimentos, que fazem mais sentido para os outros do que para nós mesmos. Como dependemos do amor e aprovação daqueles que nos cuidam, nos submetemos a esse processo e aprendemos negar seguidamente quem somos. Passamos a viver do jeito que alguém diz que temos que viver. E, quanto mais rígidos e restritos forem esses compartimentos, mais nos afastamos de quem somos e mais dificuldades teremos de nos encontrar depois.

Aprendemos a viver de fora para dentro e não de dentro para fora. A pior conseqüência disso é que a maioria de nós, quando chega o momento de se definir em termos profissionais, acaba optando por uma carreira antes de descobrir seu verdadeiro propósito. Nossa sociedade defende a idéia do sucesso como algo restrito a uma carreira estável e altamente rentável, além de alguns outros requisitos a serem preenchidos. Então, como fomos condicionados a fazer o que os outros esperam de nós, entramos na direção do conformismo. Assumimos o compromisso social e deixamos para depois uma reflexão mais profunda sobre os nossos próprios anseios.

No entanto, ter uma profissão não deve se resumir apenas a uma questão de sobrevivência ou de ganhar dinheiro, pois passamos a maior parte do dia e da nossa vida trabalhando. Então, é preciso que ele faça sentido, para que a nossa vida tenha sentido. Quando o trabalho evoca os sentimentos, quando nos proporciona alegria, inspira e fascina dá a nossa vida um significado maior, uma razão a mais para viver, um senso de destino pessoal, um propósito ou uma vocação.

Vocação é uma palavra que descende do latim e significa voz do coração. Está associada tanto a um chamado, dom ou predestinação, como a talento ou aptidão, na qual uma determinada atividade se desenvolve de maneira admirável. Vocação é diferente de profissão porque é uma expressão natural da personalidade. Todos nós deveríamos buscar uma atividade profissional correspondente aos nossos talentos naturais. Assim, não encontraríamos apenas um caminho profissional, mas também o nosso propósito e nossa realização pessoal.

No entanto, não é possível ter tudo na vida. Honrar o nosso propósito implica em perdas. Muitas vezes vamos ter que abrir mão de convites, oportunidades, hábitos, da necessidade de ser admirado e de estar de acordo com os padrões, do conforto e até de dinheiro para viver de acordo com aquilo que faz mais sentido para nós. Como diz o escritor Gabriel Carneiro Costa: “No sentido filosófico, todo mundo considera que o dinheiro tem menos importância, mas, na esfera prática, ninguém quer diminuir a renda que recebe”. E assim, seguimos insatisfeitos. Correndo o risco de chegar ao fim da vida compartilhando do arrependimento mais comum: não ter tido a coragem de viver uma vida fiel a si mesmo.

O importante a compreender é que “quem você é” e “quem você quer ser” são questões que devem vir antes e acima daquilo que você quer ter. E para isso, precisamos ter a coragem de olhar para dentro e encarar com honestidade as próprias necessidades, sonhos e desejos. Dar espaço para que a nossa autenticidade possa aparecer. Como diz o filósofo Alan Watts em seu vídeo E se o dinheiro não fosse a finalidade?, "melhor viver uma vida pequena que é cheia do que você gosta de fazer, do que uma longa vida vivida de forma miserável. Afinal, se você realmente gosta do que está fazendo, não importa o que seja, pode eventualmente se tornar um mestre nisso. E o único jeito de se tornar um mestre em algo, é fazendo o que se gosta." E então você poderá ganhar bem e ter aquilo que deseja. 

O propósito da vida não é dado, cada um constrói o seu a partir do intercâmbio entre aquilo que nos é dado e aquilo que já existe dentro de nós.

Então, qual é o propósito da sua vida?




Por Melissa Samrsla Brendler
Psicóloga - CRP 07/13831

Atende em Porto Alegre/RS







domingo, 4 de setembro de 2016

Os Sonhos na Prática





Os sonhos nascem de uma extensa parte de nós mesmos que é psíquica e que não se identifica com a nossa consciência. Por isso é chamada de inconsciente. O inconsciente possui uma linguagem própria, ele se expressa através de imagens, metáforas e símbolos. É como se fosse uma língua estrangeira. Se quisermos aprender, teremos que dedicar nosso tempo para essa aprendizagem, afim de que possamos entender o novo vocabulário e sua “estrutura gramatical”. Na verdade, não são os sonhos que são obscuros, mas nossa compreensão dos mesmos. Eles se tornam claros, na medida em que aprendemos a sua linguagem.

Existem diferentes tipos de sonhos, e cada um é diferente em qualidade e intensidade. Muitos sonhos são “comuns”, apenas refletem e comentam os acontecimentos da vida diária. Separam os acontecimentos do dia anterior ou nos preparam para o dia seguinte. Outros refletem a nossa história de vida, trabalham uma ferida antiga, algum evento traumático ou procuram integrar o passado, relembrando-o e dando-lhe um sentido. Outros, porém, são de difícil compreensão, mesmo quando levamos em conta tudo o que se passou ou que se passa na nossa vida. São os sonhos provenientes do inconsciente coletivo e, por isso, são chamados de sonhos “arquetípicos”. Esse tipo de sonho é tão carregado de energia e simbolismo, que somos obrigados a prestar-lhes atenção. Eles transcendem a nossa experiência individual e nos tocam profundamente. Para compreende-los é preciso ter conhecimento técnico, pois os símbolos que aparecem nesses sonhos são de certa forma desconhecidos e encontram paralelos nas histórias mitológicas, contos de fada e simbolismo religioso. São, por exemplo, aqueles sonhos com catástrofes naturais, seres desconhecidos, extraterrestres e animais esquisitos. Esses sonhos podem acontecer em momentos críticos da nossa vida, nos chamando atenção para um desenvolvimento maior a ser atingido pela nossa personalidade. E há também os sonhos em que recebemos informações de coisas que ainda não aconteceram ou que nos põem em contato com algo que acontece com uma pessoa que está distante. Esses sonhos parecem ter por objetivo preparar-nos para alguma ação de importância crucial ou vital. Às vezes, os sonhos também podem estar relacionados com o nosso estado de saúde física.

Como os sonhos revelam a nossa mente inconsciente, as figuras que a aparecem nos mesmos personificam algum aspecto da nossa personalidade global. As pessoas do mesmo sexo do sonhador personificam a sua sombra. A sombra representa aqueles aspectos ou qualidades que nos pertencem, mas que rejeitamos ou não reconhecemos em nós e que, por isso, precisam ser integrados. Por outro lado, as figuras do sexo oposto ao do sonhador representam aquilo que Jung denominou de anima e animus, que são respectivamente as personificações das qualidades femininas no homem e a personificação das qualidades masculinas na mulher. Essas figuras trazem complicações significativas para o relacionamento entre os sexos e têm um importância crucial para o nosso desenvolvimento, pois somente quando entendidas de forma correta é que temos acesso as camadas mais profundas do nosso inconsciente. Os sonhos nos convidam a tomarmos consciência de todas essas figuras e a encontrar a maneira pela qual a vida contida nelas se expresse adequadamente.

Como um drama, o sonho possui muitas vezes cena de abertura, desenvolvimento e conclusão. A cena de abertura do sonho expõe o problema ou a situação a respeito da qual o sonho vai tratar e, para compreender o sonho é bom prestar especial atenção ao modo como o sonho começa, porque esse início prepara o palco para tudo o que se segue. Depois desenrola-se a ação, na qual a situação de abertura do sonho se transforma em história. Geralmente, à medida que o sonho se desenrola, algum dilema é apresentado. Na conclusão do sonho está a solução ou a pista para a solução. É o desatar do nó, a sugestão que o inconsciente nos oferece de como proceder para resolver a dificuldade. O final do sonho é muito importante, pois contém o aspecto que deve ser conscientizado.

Porém, nem todos os sonhos nos oferecem uma solução. Um exemplo claro são os pesadelos. Num pesadelo, a situação que produz tensão se desenvolve e cria cada vez mais ansiedade, chegando ao ponto de despertarmos aterrorizados. Uma das razões do pesadelo é o de não encontramos solução para o impasse produtor de ansiedade no sonho. Nos pesadelos existe uma grande tensão entre a nossa atitude consciente e o inconsciente, como eles estivessem em desacordo. Eles são extremamente importantes. São como que eletrochoques que a natureza nos aplica quando quer que despertemos. O ponto do sonho em que acordamos é o choque através do qual o inconsciente diz: “É isso, preste atenção nisso!”. De alguma forma, não estamos dando a devida atenção para algum problema que é psicologicamente urgente.

Existe também o que se poderia falar de um padrão geral dos sonhos. Normalmente, na primeira metade da vida, os sonhos se referem mais a uma adaptação dinâmica à vida exterior, terrena, material. Na segunda, em geral, começam a dirigir a pessoa a recolher-se e a desenvolver uma certa sabedoria ou insight sobre o que está por trás da vida aparente. Os últimos sonhos de pessoas à beira da morte são claramente uma preparação para o que está por vir. Não abordam a morte de uma forma concreta, mas falam de uma transformação ou passagem para um outro estágio ou nível.

Enfim, nós não sabemos de onde viemos, nem o porque de estarmos aqui e tampouco sabemos para onde vamos. Todos nós fazemos parte desse grande mistério que é a existência. No entanto, os sonhos nos mostram que parece haver uma força diretriz, um padrão dominante que organiza a vida interior, que Jung deu o nome de Self. Nossa vida interior não é um fenômeno caótico e casual como muitos pensam, ao contrário, ela tem um centro e uma finalidade.

O desenvolvimento humano assemelha-se a uma árvore que para crescer deve possuir raízes muito firmes na terra. E o problema do nosso tempo é estarmos como árvores sem raízes. Nossas raízes não atingem a profundidade suficiente para extrair o alimento com o qual crescemos em direção ao domínio do espírito. Os sonhos são raízes que atingem as profundezas da alma e ajudam o fluxo da energia para o crescimento e desenvolvimento que nos são possíveis. Por isso, preste atenção nos seus sonhos!



Por Melissa Samrsla Brendler
Psicóloga - CRP 07/13831
Atende em Porto Alegre/RS



Fontes: HALL, James A. Jung e a Interpretação dos Sonhos: manual de teoria e prática. São Paulo: Cultrix, 2007. SANFORD, John A. Os Sonhos e A Cura da Alma. São Paulo: Edições Paulinas, 1988. BOA, Fraser, VON FRANZ, Marie Louise. O Caminho dos Sonhos. São Paulo: Cultrix, 2007.