domingo, 18 de setembro de 2016

Individuação: tornar-se si mesmo





Todos nós possuímos uma tendência inata, natural e espontânea para encontrar nosso centro, nossa unidade, ou nossa totalidade.  Essa tendência não é um fim, mas um processo, que se desenvolve no tempo, chamado de “individuação”. A individuação consiste em evoluir de um estado infantil de identificação com o inconsciente para um estado de maior diferenciação em relação a ele, resultando na ampliação da consciência. Os elementos inatos da nossa personalidade, seus componentes mais imaturos e as experiências de nossa vida procuram se integrar ao longo do tempo formando uma totalidade em pleno funcionamento.

Da mesma forma que possuímos uma estrutura física comum, todos temos também uma estrutura psíquica comum. Todos nós possuímos um coração e um pulmão, por exemplo. Com a psique acontece algo semelhante, pois ela também possui uma estrutura e um modo de funcionar que são comuns. Os arquétipos são esses elementos comuns da psique humana e, de certa forma, corresponderiam aos elementos comuns do corpo humano.

Os arquétipos são os blocos básicos da construção da personalidade. São padrões de emoção, de imaginação e de significado. A soma de todos eles compõe o inconsciente coletivo e forma o substrato básico da nossa vida emocional. Quando ativados, atingem a consciência e influenciam no desenvolvimento e expressão da nossa personalidade de forma bem definida. Os arquétipos nos impelem a certa atividade física, que será acompanhada por imagens, fantasias e emoções características.

Um bom exemplo é a experiência de apaixonar-se por alguém, uma experiência típica e que apresenta uma base arquetípica. Quando nos apaixonamos, sentimos um desejo sexual e ao mesmo tempo nossa consciência é inundada por fantasias referentes à pessoa amada. Experimentamos o surgir de profundas emoções e verificamos que no centro de tudo há um significado profundo. É um estado de coisas único para nós. No entanto, em todo mundo a linguagem do amor é admiravelmente a mesma. A experiência humana em si é tão antiga como a própria vida humana. Em outras palavras, é uma experiência arquetípica.

É claro que a vida humana é, ao mesmo tempo, única. Apesar dos corpos humanos possuírem todos a mesma estrutura, não são, contudo, exatamente iguais. O mesmo acontece com as personalidades. A personalidade de cada um jamais existiu antes. Há alguma coisa em cada pessoa que faz com que seja ela somente. No entanto, enquanto vivemos inconscientemente, tendemos a ser semelhantes aos demais. Os arquétipos vão nos formando de acordo com os moldes gerais da humanidade, e tornamo-nos o homem coletivo. Mas se adotamos uma outra atitude em relação ao inconsciente, se nos tornamos conscientes do que somos e dos elementos únicos que existem em nós, então começa o desenvolvimento individual. Os mesmos arquétipos que antes nos modelavam pelo tipo de homem comum, agora começam a nos ajudar a nos tornar indivíduos, no momento em que estabelecemos uma relação consciente com eles.

O inconsciente coletivo, ou a soma de todos os arquétipos, portanto, contém não apenas a sabedoria do passado, como também a energia do futuro ou um enorme potencial criativo. A vida está constantemente lutando por fazer surgir formas novas e únicas. No centro do inconsciente há um instinto profundo para tornar-se si mesmo, para expressar a personalidade única que há em nós. Uma personalidade que é integrada ao inconsciente. Naturalmente, ninguém consegue tornar-se um indivíduo completo e total. Sempre ficam muitas possibilidades em nós que poderiam ser desenvolvidas em nossa vida. O importante é o processo de tornar-se uma pessoa mais desenvolvida. É isso que dá significado à vida e interesse pela mesma. O sofrimento e as doenças psíquicas são decorrentes da nossa resistência ao desenrolar natural desse processo.

A individuação é o instinto fundamental da vida. Atua sobre nós e nos impele a procurar e a tomar consciência da nossa totalidade. Não só tomar consciência, como também expressa-la. O objetivo é nos tornarmos a pessoa que realmente somos, e isso não se dá somente através do processo de aceitação de si mesmo. Além de se conhecer, devemos também nos colocar no mundo. Buscar o equilíbrio entre as demandas do mundo externo e interno. Descobrir o nosso papel na sociedade, o lugar em que podemos viver a nossa própria natureza individual para o bem-estar da sociedade. Esse processo não nos leva ao isolamento, mas a um relacionamento mais íntegro com o coletivo. Tornar-se si mesmo não significa tornar-se perfeito, mas pleno e completo. Assumir a própria condição humana tal qual se apresenta, e vive-la com todas as suas implicações e riquezas, com todas as dores e as delícias de ser quem se é.



Por Melissa Samrsla Brendler
Psicóloga - CRP 07/13831
Atende em Porto Alegre/RS










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