sábado, 19 de dezembro de 2015

O que é Espiritualidade?





Fazemos parte de uma cultura que é extremamente materialista, racionalista e voltada para o “fazer” e “acontecer” o tempo todo, o que nos estimula constantemente a subestimar tudo aquilo que é voltado para o nosso mundo interior. O drama atual, e também a conseqüência, é que perdemos a nossa capacidade de viver um sentimento de conexão com nós mesmos e também com tudo aquilo nos cerca. Perdemos contato com aquela dimensão em nós que coloca as questões mais profundas e fundamentais da nossa vida: de onde viemos e para onde vamos, o que estamos fazendo aqui, qual é o sentido de estarmos nessa vida.

Por outro lado, as religiões, as convicções e as verdades que dirigiram a nossa sociedade por um longo tempo, e que proporcionavam um espaço para a vivência de todos essas questões, envelheceram e se tornaram sistemas petrificados. Atualmente, não encontramos mais nada que as possa substituir. A maioria de nós sente como se vivesse uma vida robótica, desprovida de um significado maior. Trabalhamos, comemos, dormimos, passeamos, mas lá no fundo de nossas almas não nos sentimos realmente vivos. Então, buscamos anestesiar o nosso vazio existencial de diversas formas, através do consumo, por exemplo. Hábitos e atitudes que estão destruindo o Planeta em que vivemos. Esse é o cenário e também o drama no qual todos nos encontramos, e é por isso que muitas pessoas hoje em dia, entre outras coisas, têm buscado desenvolver sua espiritualidade.

Carl Gustav Jung foi um dos poucos estudiosos da alma humana que deu valor e importância ao desenvolvimento da espiritualidade. Ele observou na sua prática clínica que todos os seus clientes, em última instância, estavam doentes por terem perdido aquilo que a religião sempre deu. E nenhum se curou realmente sem recobrar a atitude religiosa diante da vida. Religiosa não no sentido de aderir a uma crença em particular, ou tornar-se membro de alguma igreja, mas no sentido de re-ligar, integrar novamente a dimensão espiritual.

Hoje, mais do que nunca, as pessoas estão desconectadas da Terra e do sentimento de união com todas as coisas e, portanto, sem espiritualidade. A função principal da espiritualidade é nos religar a tudo que existe ao nosso redor e também à fonte misteriosa de vida que existe dentro de todos nós. Jung deu o nome de Self para este centro interior, mas outros também têm chamado de Eu Superior, Criança Interior ou até mesmo Deus.

Há de se pensar em se tratar de algo mágico, místico ou esotérico, mas não. Na verdade, desenvolver a espiritualidade tem a ver com o resgate e o cultivo de todos os valores não materiais, com energias que são altamente positivas como confiar, amar, abrir-se aos demais, ser capaz de perdoar, sentir empatia, gratidão, compaixão, solidariedade, e a capacidade de se indignar com as injustiças deste mundo.

Nesse sentido, precisamos entender que espiritualidade é diferente de religião. Elas se complementam, mas não se confundem. A espiritualidade existe desde que o homem surgiu na natureza, não é uma institucionalização. É livre e criativa e nela predomina a voz interior, a sabedoria que cada um carrega dentro de si. Por isso, ela passa pela vivência e pelo autoconhecimento, e pressupõe a tolerância com o diferente. Também tem a ver com aprender com os próprios erros. Promove perguntas e não respostas. Nos faz transcender o nosso próprio ego e a valorizar tudo aquilo que promove a vida e o bem. Espiritualidade é meditação, experiência, cuidado, e nos ensina a amar o próximo e a natureza. O tal sentimento de conexão.

A Terra está doente porque nós estamos doentes. Na medida em que nos transformarmos, transformaremos também a Terra. Assim, desenvolver a espiritualidade, ou seja esse sentimento de conexão com nós mesmos e com tudo aquilo que nos cerca, é um dos poucos caminhos, se não o único, que pode nos levar para fora da atual crise em que nos encontramos e inaugurar uma nova era, uma nova fase da Humanidade, mais integrada com o todo, mais harmônica, e, portanto, mais espiritual.



Por Melissa Samrsla Brendler
Psicóloga - CRP 07/13831
Atende em Porto Alegre/RS








Fontes: BETTO, Frei. Espiritualidade e Religião. Coluna publicada no jornal O Globo em 08.05.2014 (http://oglobo.globo.com/sociedade/espiritualidade-religiao-12415633); BOFF, Leonardo. C. G. Jung e o Mundo Espiritual. (www.leonardoboff.com/site/vista/2009/nov06.htm); MOURÃO. Hellen Reis. A Busca da Sentido. Café com Jung (cafecomjung.blogspot.com.br); TRUNGPA, Chögyam. Além do Materialismo Espiritual. São Paulo: Cultrix, 2008. 


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